UM DESENHO FEITO DE PAIXÃO

Por Bernardo Farkasvölgyi//

Para mim, todo o processo criativo parte exatamente de uma ideia que, com a ajuda do lápis, consigo materializar no papel. Isso é o croqui (que vem do francês “croquis”, mas eventualmente traduzimos para o português sem o “s” mesmo). É um esboço ou conjunto de traços que consegue concentrar todo o conceito e a alma de algo que surgiu na minha cabeça, mas que vai servir de linha guia nas sucessivas fases de realização daquilo que na arquitetura chamamos de projeto.

Especialmente pra mim, o croqui é uma ferramenta indispensável, pois é o reflexo mais imediato da minha imaginação, a forma criativa e poética com a qual consigo conceber uma futura edificação. É sem dúvida o começo de tudo, o primeiro impulso e lampejo, capaz de transformar qualquer sonho arquitetônico em uma realidade.

Ao falarmos da Arena MRV, definitivamente ela é um sonho que se torna real. Não só meu, mas um sonho coletivo. E também um símbolo, o primeiro estádio da história do Clube Atlético Mineiro, uma casa para tantos, um equipamento de entretenimento e eventos valioso para a cidade, um motor de desenvolvimento para a economia local. Acima de tudo, a Arena MRV é o fruto desse desejo inabalável de uma nação atleticana, de cada torcedor que sonhou ver chegar esse momento no qual, agora, ela está sendo construída.

A Arena MRV ganhou suas formas já nos primeiros croquis que desenhei a lápis em 2013. O fato de eu ser atleticano desde que me entendo por gente foi crucial, pois no desenho vieram as memórias afetivas que remetem às primeiras vezes que fui a um estádio, ainda na década de 1970, e vi a torcida alvinegra descer estendidas pelas arquibancadas faixas brancas e pretas. Aquela imagem, guardada em algum lugar no meu inconsciente, no momento certo foi acionada e serviu de grande inspiração. Assim, naturalmente, acabei por estampá-las no design do projeto, permitindo criar um vínculo imediato com os torcedores. É importante dizer isso, pois esse vínculo foi essencial: desde a fase de aprovação inicial do projeto, viabilização econômica, inúmeras e exaustivas etapas burocráticas, cada momento foi sustentado pela paixão da massa atleticana. E assim, o sonho expresso com lápis e papel, movido por esse amor alvinegro, em seguida se tornou um primeiro desenho em perspectiva realista, uma maquete, começou a surgir como uma realidade 3D e, no processo, ganhou mais de 30 versões ao longo de sete anos. Um projeto imensamente rico e detalhado, que ainda não parou. Partiu envolvendo 15 profissionais da minha equipe e hoje engloba mais de 300 especialistas das áreas mais diversas, como os de sistemas de automação e estruturais, sistemas hidráulicos e elétricos, paisagismo, alvenarias, fluxo de pessoas e multidões, sinalização de trafego, meio ambiente, entre tantos outros.

Hoje, comemorando um ano desta coluna em parceria com o Jornal da Cidade, feita para falar de arquitetura e espaço urbano, tenho o prazer de dividir com vocês um de meus croquis da versão mais atual da nossa arena. Uma forma de expressar minha paixão e agradecer a cada atleticano e belo horizontino que sonhou junto comigo. Fico imensamente feliz e orgulhoso em poder dizer que o fruto daqueles primeiros rabiscos é hoje uma arena projetada nos mínimos detalhes, que será moderna, acessível, múltipla, inteligente e, mais do que tudo, um lugar capaz de potencializar a emoção de cada momento que ainda viveremos ali. A Arena MRV não será apenas a grande casa do atleticano, mas uma grande casa para o futebol brasileiro.

JORNAL DA CIDADE BH / Edição de 16 de julho de 2020